PROJETO NASCEU NO CORAÇÃO DA SERRA DO CALDEIRÃO
Arbun: um sabor a medronho que ‘não é para velhos’. É para todos.
por Ana Sofia Varel
A imagem é moderna e apelativa. Os sabores estão na Serra do Caldeirão. As palavras deixam perceber a paixão pela terra e a vontade de potenciar algo que, para muitos, ainda é subvalorizado.
Simplificando, não faltaria muito mais a Luís Domingues e a João Martins, responsáveis pela marca Arbun, para criar um projeto inovador, além de vontade, muito esforço e uma nova visão. Engenheiros florestais, há 20 anos que percorrem a serra e veem o potencial do medronheiro.
Há quatro decidiram avançar com um sonho antigo e começaram a desenhar um novo conceito, que foi lançado em plena pandemia, um obstáculo que não os fez parar um plano que já estava em andamento. Adaptaram-se às realidades e têm, cada vez mais, conquistado novos apreciadores.
Afinal de contas o que Arbun traz de novidade são as novas formas de ‘beber’ medronho, um fruto que inspira estes dois profissionais e agora empresários a fazer mais e melhor com um produto endógeno na Serra do Caldeirão.
Para já, existe uma gama de cinco garrafas que poderá vir a crescer: o Original, o Juniper Premium (Gin de Medronho), o Juniper (Dry Gin), o Citric (Destilado cítrico) e o Honey (Melosa).
A diferença desta marca é mesmo esta nova forma de ver e valorizar o medronho. “A Arbun pretende colocar o medronho e, particularmente o destilado a que este fruto dá origem, num patamar de excelência que pensamos ser seu por direito, mas que ainda não conseguiu atingir”, começa por explicar Luís Domingues.
O grande objetivo para estes engenheiros florestais é desafiar os públicos que apreciam bebidas destiladas, mas que não têm um conhecimento adequado das qualidades da aguardente de medronho, a descobrir esta tradição portuguesa.
“Tratam-se, muitas vezes, de consumidores exigentes, que procuram não só bebidas de qualidade, mas esperam também uma imagem cuidada e valorizam a história, tradições e métodos de produção. A aguardente de medronho pode cumprir todas estas exigências e trabalhamos para que assim seja”, acrescenta.
Um dos exemplos, a criação de um gin, está incluída nessa estratégia da marca em alargar a base de consumidores. Quer sejam apreciadores das ‘espirituosas’, das aguardentes ou de bebidas mais ‘leves’. Ou seja, o que pretendem é que o consumidor descubra estas qualidades da aguardente, atingindo assim diversos públicos. O gin de medronho e a ‘melosa’ são exemplos, nesta gama, que podem ir ao encontro do gosto de quem não é um grande apreciador de aguardente.
“A gama diversificada Arbun serve ainda o propósito de valorizar outros produtos locais como o zimbro, os cítricos e o mel”, destaca João Martins. E está no plano destes investidores continuar a pesquisar novas soluções inovadoras que permitam levar o medronho a um público cada vez mais amplo. “Temos sempre como objetivo promover a versatilidade do medronho, razão que nos levou ao desenvolvimento do nosso gin e à reinvenção da melosa”, acrescenta ainda o engenheiro florestal. Por isso, basta estar atento às novidades…
Conceito que aproveita saberes e sabores
‘Inspirados pelo Medronho’ é a assinatura que reflete a centralidade que este fruto assume em tudo o que estes empresários fazem.
Ainda que seja a base, é apenas uma parte dos saberes e sabores da região que inspiram os criadores da Arbun. É por esta razão que querem colocar estes produtos da serra num patamar de excelência, respeitando a história e tradição, sem abdicar da inovação qualidade e respeito pela natureza. Estão também atentos à questão do desenvolvimento de uma área, muitas vezes desertificada, e têm consciência da importância a nível da economia local. Aliás, o fruto que processam na destilaria é proveniente de áreas que gerem, mas também compram cerca de 50 por cento dos medronhos a diversos produtores da Serra do Caldeirão. Exploram cerca de 400 hectares de medronheiro espontâneo e, há dois anos, iniciaram a plantação de uma área de cerca de 50 hectares de medronheiros clonados, que serão explorados como um pomar.
Quando o fruto entra na destilaria são os únicos responsáveis por todo o processo, desde a fermentação, à destila e ao embalamento.
Obstáculos da pandemia
A principal montra desta marca é uma loja online. Quando começaram a colocar a marca no mercado, no início do ano passado, surgiu a pandemia. “Tínhamos como objetivo a comercialização nos canais mais comuns, como o retalho e o horeca, mas o encerramento de muitos dos estabelecimentos impediu-nos de termos uma presença mais consistente junto do público. De maneira a conseguirmos ‘fintar’ estes problemas fizemos uma aposta mais forte na venda online”, avança Luís Domingues. Criaram então uma apelativa loja virtual.
Têm uma política de entregas gratuitas entre 24 a 48 horas úteis.
Aos poucos foram trabalhando a presença nalgumas garrafeiras em todo o país, bem como em lojas de produtos gourmet e de comércio tradicional no Algarve. Apesar da marca já estar em alguns restaurantes e bares, ainda há pouca expressão, pois estes estabelecimentos têm sofrido uma constante abertura e encerramento devido à pandemia. Assim, que esta situação da covid-19 acalmar a Arbun quer estar mais presente num maior número de espaços.
“Temos aproveitado o tempo que a pandemia nos ‘ofereceu’ para trabalhar na preparação de outras atividades que incluirão, num futuro próximo, visitas e degustações nas instalações da nossa destilaria”, conclui João Martins.
Uma campanha publicitária com humor
“O nome da campanha usa o trocadilho e o humor para tornar memorável uma mensagem que para nós é essencial: Arbun não é para velhos hábitos ou velhos costumes. É para qualquer pessoa de qualquer idade com espírito jovem e gosto sofisticado”, revela Luís Domingues.
A intenção é desmistificar a antiga imagem do medronho como ‘mata-bicho’, criada devido a algumas produzidas sem preocupações pela qualidade.
Por sua vez, os engenheiros florestais consideram que é “essencial educar o consumidor para a melhor forma de o consumir. Convidamos quem nos está a ler a trocar o copo de ‘shot’ após um café por um cálice de pé, servido fresco, acompanhado por uma boa sobremesa, especialmente uma tradicional à base de ovos”, desafiam os empresários.
Esta campanha foi ainda idealizada para se afastarem das segmentações por género e idade. “Procuramos atingir um consumidor sofisticado que procura qualidade e, entre estes, nesta fase de arranque, comunicamos diretamente para aqueles que gostam de novas experiências e desafios, o que explica o tom provocador do ‘Isto não é para velhos’”, esclarecem ainda.
E para chegar ao consumidor, ainda mais numa época cada vez mais digital, apostaram nas redes sociais para promover os novos produtos.
“Desde o início entendemos que deveríamos fazer uma aposta forte nesta área. Temos feito alguns progressos e já chegamos a um número significativo de pessoas, mas ainda não estamos no nível que gostaríamos. Vamos continuar a manter uma forte atividade nas nossas redes e esperamos articular isso com outras campanhas de maneira a darmos a conhecer os nossos produtos a um maior leque de consumidores, quer no Algarve, quer nas restantes regiões do país”, dizem.
Um sonho antigo
“A ideia de valorizar a produção do medronheiro, pegar nos seus subprodutos tão tradicionais e valorizá-los através de modernidade e qualidade já era um sonho antigo, mas é em 2017 que o projeto começa a ganhar forma”, começam por explicar. Luís Domingos é o principal responsável pela marca, mas conta com João Martins para desenvolver este projeto.
Tanto que, após muito estudo e pesquisa, começaram a planear uma unidade de produção de destilados. No início, apostaram em Cachopo, no concelho de Tavira, onde transformaram uma destilaria tradicional. Mais tarde, subiram um pouco mais a serra e foram parar a São Barnabé, no concelho de Almodôvar, na zona raiana de Alentejo e Algarve. Lá construíram uma unidade mais moderna, onde trabalham na atualidade, mas continuam a dar primazia ao Algarve.
‘Chão’ da Serra do Caldeirão tem muito valor
Numa terra de turismo, assente na dependência de ‘vender’ o destino, são necessárias alternativas de negócios. A agricultura tem sido para alguns empresários um setor a explorar, mas ainda há quem subestime o valor e o potencial que pode atingir, ainda mais se for aliado à inovação, modernidade e sustentabilidade.
Os responsáveis por esta nova marca nem hesitam quando questionados sobre se a agricultura ainda tem futuro. “Temos a certeza que as atividades agrícolas e florestais da Serra do Caldeirão têm futuro. As técnicas evoluíram, bem como as exigências dos consumidores, e é imperativo que os produtores acompanhem essa tendência”, afirmam.
A experiência de lançar este novo projeto, fê-los compreender que apesar das exigências encontradas, há um conjunto de mais-valias que estão subavaliadas e que deveriam ser valorizadas com urgência.
“Pensamos que nos próximos tempos outros projetos agroflorestais poderão surgir garantindo a criação de mais valor e a consequente fixação de populações, essencial à sobrevivência das áreas rurais”, referem.
Consumidores preocupados com a sustentabilidade
Ao longo dos tempos, o perfil do consumidor foi evoluindo. Se antes, não era dada tanta importância a algumas questões, hoje a qualidade, a sustentabilidade e o respeito pelos valores naturais assumem-se como requisitos na altura da compra. “Neste sentido, muitos dos produtos endógenos dos territórios rurais algarvios, nomeadamente da Serra do Caldeirão, onde se inclui o medronho, mas também o mel, as ervas aromáticas, os cogumelos e outros poderão, se explorados de uma forma cuidada, cumprindo as expetativas destes consumidores”, explicam os engenheiros florestais.
A qualidade está no topo, por isso, o esforço deve ser investido na gestão da produção, na adoção de técnicas de transformação que garantam a manutenção das características e de práticas amigas do ambiente, bem como de uma estratégia de promoção que dê a conhecer os produtos ao grande público.
Sabia que:
“O nome ARBUN resulta da nomenclatura científica da espécie medronheiro (Arbutus Unedo). Este nome, associado ao logotipo que desenvolvemos, pretende demonstrar que o medronheiro, aquilo que esta espécie representa para o território da Serra do Caldeirão e as suas gentes, é o ator central da nossa estratégia”
in Revista Algarve Vivo nº96 (maio /junho 2021)